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Análises de Conjuntura

Percepções brasileiras, diálogos aguardados: resistências ao acordo Mercosul-União Europeia

Análise das principais críticas de stakeholders e formadores de opinião na sociedade brasileira

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Considerando o papel estratégico do Brasil na articulação e na consolidação do Mercosul e no acordo birregional entre Mercosul e União Europeia (UE), uma análise das percepções de stakeholders e formadores de opinião na sociedade brasileira contribui para mapearmos as principais críticas veiculadas pelo debate público e entre atores interessados e identificar os diálogos necessários – e esperados – entre a sociedade civil e governo sobre temas-chave do acordo interregional.

A política externa do novo governo Lula já deu sinais de mudança concreta e gerou expectativas positivas para países europeus antes resistentes ao avanço do acordo, sobretudo no campo dos temas ambientais, com impacto em direitos de populações originárias e justiça ambiental. Na mesma linha, o Embaixador da UE no Brasil, Ignacio Ybáñez, tem expressado publicamente sua visão sobre o aumento da importância do acordo para a Europa em função da guerra na Ucrânia, que catalisa a necessidade de busca de reforço dos laços com atores como o Brasil e os países da América do Sul.

Apesar das expectativas, ainda persiste na sociedade brasileira setores que questionam os termos e se opõem ao avanço do acordo nos moldes do que foi assinado e do que se tem conhecimento. A partir de uma coleta de dados sobre percepções de atores resistentes e críticos ao acordo, publicados em fontes de relatos, entrevistas ou material oficial de organizações, esperamos mapear os argumentos dos stakeholders brasileiros e atores formadores de opinião, muitas vezes relegados a segundo plano diante da atenção voltada ao posicionamento crítico internacional do Parlamento Europeu e outros Estados membros da UE. Em outras palavras, para a conclusão exitosa dos trâmites, não há só críticas europeias a serem observadas, mas também brasileiras, especialmente aquelas que se originam em setores que dão suporte político ao atual governo eleito.

Como contribuição, identificamos as principais preocupações, argumentos que as justificam e os stakeholders e formadores de opinião que as sustentam. O quadro abaixo é o resultado da coleta e sistematização de pronunciamentos e posicionamentos de atores e grupos que questionam a legitimidade do acordo ou esperam do novo governo uma demanda por sua revisão. 

Percepções críticas brasileiras sobre o Acordo Mercosul-UE

Tabela 1. Percepções críticas brasileiras sobre o Acordo Mercosul-UE. 

Priorizamos nesta análise de conjuntura a perspectiva crítica de setores da sociedade civil com o objetivo de reflexão sobre o potencial do novo governo em dialogar e diminuir a resistência ao acordo, ao buscar responder às demandas de sua própria base política – o que pode depender de políticas públicas nacionais para a amenização de alguns impactos mencionados pelos críticos do acordo. O holofote nas críticas da sociedade civil se torna estratégico, uma vez que o acordo aparece como tema relevante da agenda de política externa da atual administração.

Naturalmente, há argumentos em defesa do acordo não tratados neste artigo, especialmente de setores comprometidos com o agronegócio, o comércio internacional e a exportação. A visão positiva desses setores se baseia nas expectativas de aumento do volume de comércio nacional, além do impacto sobre harmonização de normas e enquadramento da produção exportadora em relação a padrões internacionais que impactam novas possibilidades e a ampliação de parcerias. Alguns setores argumentam, ainda, que o acordo seria positivo para a questão ambiental, ao promover a  criação de mecanismos de fiscalização eficientes contra o desmatamento, proteção de direitos de propriedade de povos originários, fim do garimpo e outras atividades ilegais nas florestas, como pesca e contrabando de madeira. 

Conclusão

Dos governos anteriores de Lula, embora em cenários internacionais e domésticos significativamente diferentes, demandas por igualdade de tratamento nos processos de negociação e a expectativa de se revisitar termos desfavoráveis a setores brasileiros permanecem como elementos de análise sobre as relações comerciais entre países do Sul com países do Norte.

Diante da nova administração e dos impasses já enfrentados externamente com países europeus e com o Parlamento Europeu, em função das exigências de medidas vinculantes que aumentem garantias ao cumprimento de compromissos ambientais, o mapeamento das percepções sobre diversos termos do acordo visa informar diagnósticos e visões sobre resistências internas, necessidade de diálogos e arranjos de políticas públicas setoriais e composições subnacionais para que o novo governo eleito concentre esforços para manter suporte popular, decisivo para a efetividade das medidas de ajuste nos setores industriais e empresariais e das reformas políticas e legais  que o acordo exige. 

Notas

i - Em função do número de organizações que assinam o posicionamento geral, não mencionaremos individualmente todas, podendo ser consultadas no documento: Frente de organizações da sociedade civil brasileira contra o acordo Mercosul-UE e no texto da carta aberta aos candidatos/as ao Congresso Nacional e Executivo Federal

ii - Cf. 10 Motivos para dizer não ao acordo Mercosul-UE

iii - Cf. posição conjunta entre The Greens/EFA (Grupo do Parlamento Europeu), Fundacion Rosa Luxemburgo e CLACSO (Ghiotto & Echaide 2020). 

iv - Cf. por ex., Carneiro (2019). 

v - Em documento conjunto de ONGs brasileiras e europeias, o posicionamento comum é o de que o acordo promova barreiras ao futuro desenvolvimento local dos países do Mercosul (Hansen-Kuhn 2020).

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Recebido: 22 de abril de 2023

Aceito para publicação: 18 de maio de 2023

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