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Policy Papers

A Democracia sob pressão: o que está acontecendo no mundo e no Brasil

Reflexão sobre a experiência brasileira de recessão democrática

Resumo

O artigo identifica três fenômenos que estão por trás do processo histórico que vem sendo descrito como de recessão democrática: o populismo, o extremismo e o autoritarismo, assim como suas causas políticas, econômico-sociais e cultural-identitárias. Após uma análise do contexto mundial, o texto foca na experiência brasileira dos últimos anos, narrando as ameaças à legalidade constitucional e a reação das instituições. São identificados alguns dos inimigos internos da democracia, em âmbito global, e três pactos necessários para o seu aperfeiçoamento no Brasil.

Palavras-chave:

constitucionalismo; democracia; populismo; extremismo; autoritarismo.

O texto que se segue procura fazer uma reflexão objetiva acerca do estado da arte da democracia no mundo e no Brasil. De início, assenta-se a ideia de democracia constitucional, com a demonstração de que foi ela a ideologia vitoriosa do século XX. Em seguida passa-se ao ponto central do trabalho, que é a análise do desgaste da democracia no mundo contemporâneo, em um contexto que vem sendo referido como recessão democrática, democracias iliberais e constitucionalismo abusivo, em meio a outras qualificações depreciativas. O diagnóstico dos problemas do momento atual passa pela identificação de três fenômenos conceitualmente distintos, mas frequentemente associados, que são o populismo, o extremismo e o autoritarismo, bem como suas causas políticas, econômico-sociais e cultural-identitárias. Reserva-se, ao final, uma seção específica acerca do estado da democracia no Brasil, notadamente após as eleições de 2018 e, já agora, às vésperas das eleições de 2022. Em meio à radicalização e à polarização vigentes, são sugeridos três pactos capazes de funcionar como denominadores comuns mínimos de uma agenda para o país. A construção, consolidação e preservação das instituições entre nós tem sido uma aventura em capítulos tensos, com perigos, sobressaltos, reviravoltas e a resiliente esperança de um final feliz.

A democracia no mundo: a ascensão do populismo autoritário

O constitucionalismo democrático foi a ideologia vitoriosa do século XX. Nesse arranjo institucional, fundiram-se duas ideias que não se confundem, quer nas suas origens, quer no seu conteúdo: constitucionalismo e democracia. O Constitucionalismo remonta às revoluções liberais dos séculos XVII e XVIII e significa, essencialmente, Estado de direito, poder limitado e respeito aos direitos fundamentais. Sua consolidação nos países da Europa e nos Estados Unidos se deu ao longo do século XIX. No Brasil, a Constituição de 1824 possuía alguns traços liberais, mas, na sua essência, trazia a marca da origem absolutista imprimida por D. Pedro I, ainda que atenuada, substancialmente, ao longo do segundo reinado. Democracia, por sua vez, desde suas origens gregas, significa participação popular no exercício do poder, soberania do povo, governo da maioria. O ideal democrático apenas se consolida, verdadeiramente, quando já avançado o século XX, com a consagração do sufrágio universal. Somente então viram-se inteiramente superadas as restrições à participação de todos no processo eleitoral, como as de renda, religião, raça e gênero.

Nada obstante, a maior parte das democracias do mundo reserva uma parcela de poder político para um órgão que não é eleito, mas que extrai sua legitimidade da competência técnica e da imparcialidade. Trata-se do Poder Judiciário, em cujo topo, no caso brasileiro, está o Supremo Tribunal Federal. Desde o final da 2ª Guerra Mundial, praticamente todos os Estados democráticos adotaram um modelo de supremacia da Constituição, tal como interpretada por uma suprema corte ou por um tribunal constitucional. Foi a prevalência do modelo americano de constitucionalismo, com a superação da fórmula que predominara na Europa, até então, que era a supremacia do Parlamento. Tais cortes e tribunais podem declarar a inconstitucionalidade de atos do Legislativo e do Executivo, tendo como um de seus principais papéis arbitrar as tensões que muitas vezes existem entre constitucionalismo e democracia – i.e., entre direitos fundamentais e soberania popular. Cabe a essas cortes e tribunais proteger as regras do jogo democrático e os direitos de todos contra eventuais abusos de poder por parte da maioria. Em muitas partes do planeta, elas têm sido um importante antídoto contra o autoritarismo (Issacharoff 2015, i).

Em suma: o Estado democrático de direito, como referido no art. 1º da Constituição brasileira, é um regime político fundado na soberania popular, com eleições livres e governo da maioria, bem como em poder limitado, Estado de direito e respeito aos direitos fundamentais de todos, aí incluído o mínimo existencial. Sem terem as suas necessidades vitais satisfeitas, as pessoas não têm condições de serem verdadeiramente livres e iguais. Há também um elemento emocional, humanístico, na democracia, que é o sentimento de pertencimento, de participação efetiva em um projeto coletivo de autogoverno, em que todos e cada um merecem igual consideração e respeito (Dworkin 1977, 131; 2008, iii). Quem se sente excluído não tem razão para apoiá-la e é presa fácil de tentações populistas e autoritárias.

A democracia não se limita ao momento do voto. Ela se manifesta, também, no respeito aos direitos fundamentais de todos, inclusive das minorias.

A democracia contemporânea é feita de votos, direitos e razões. Isso dá a ela três dimensões diversas: a) a democracia representativa, que tem como elemento central o voto e como protagonistas o Congresso Nacional e o Presidente da República, que são agentes públicos eleitos pela vontade popular; b) a democracia constitucional, que tem como elemento central os direitos fundamentais e como protagonista o Poder Judiciário, em cuja cúpula está o Supremo Tribunal Federal; e c) a democracia deliberativa, que tem como elemento central o debate público, o oferecimento de razões, de justificações para as decisões políticas, e como protagonista a sociedade civil (Barroso 2019a). De fato, a democracia não se limita ao momento do voto. Ela se manifesta, também, no respeito aos direitos fundamentais de todos, inclusive das minorias. Os derrotados no processo político majoritário não perdem a condição de sujeitos de direito e de participantes do processo político-social. Além disso, a democracia atual é feita de um debate público contínuo, que deve acompanhar as decisões políticas. Um debate aberto a todas as instâncias da sociedade, o que inclui movimento social, imprensa, universidades, sindicatos, associações, cidadãos comuns, autoridades etc. 

A democracia como ideologia vitoriosa do século XX e a recessão democrática atual

Como assinalado logo ao início, o constitucionalismo democrático prevaleceu historicamente sobre os projetos alternativos que com ele concorreram ao longo do século XX. Foram eles o comunismo, após a Revolução Russa de 1917; o fascismo, irradiado a partir da Itália de Mussolini, com início nos anos 1920; o nazismo, sob a liderança de Hitler na Alemanha, a partir dos anos 1930; os regimes militares, que dominaram a América Latina, a Ásia, a África e mesmo alguns países europeus no segundo pós-guerra; e o fundamentalismo religioso, que teve como marco a revolução dos aiatolás no Irã em 1979. O modelo vencedor consagrou a centralidade e a supremacia da Constituição – e não do partido, das Forças Armadas ou do Alcorão. Alguns autores chegaram mesmo a falar no fim da história, celebrando a democracia liberal como o ponto culminante da evolução institucional da humanidade (Fukuyama 19891992).

De fato, foram diversas as ondas de democratização (ver Huntington 1991)[1]. Uma delas se deu ao final da Segunda Guerra Mundial, num ciclo que incluiu a Alemanha, a Itália, o Japão e mesmo o Brasil, que, no entanto, voltou a cair no autoritarismo nos anos 1960. A segunda onda veio nos anos 1970, atingindo países como Portugal, Espanha e Grécia. Uma terceira onda se formou nos anos 1980 em países da América Latina, como Brasil, Chile, Argentina e Uruguai. E, logo à frente, com a queda do muro de Berlim, os anos 1990 assistiram à democratização e reconstitucionalização dos países da Europa Central e Oriental, incluindo Hungria, Polônia e Tchecoslováquia. Também nos anos 1990, com o fim do Apartheid, veio a democratização da África do Sul. Na virada para o século XXI, mais de uma centena de países (119) adotara esse modelo, de acordo com a Freedom House[2].

Apesar do sucesso narrado na breve retrospectiva feita acima, nos últimos tempos alguma coisa parece não estar indo bem. Há uma onda populista, extremista e autoritária atingindo inúmeras partes do mundo, levando muitos autores a se referirem a uma recessão democrática (Diamond 2015) ou a um retrocesso democrático (Huq & Ginsburg 2018, 91), como já mencionado anteriormente. Os exemplos foram se acumulando ao longo dos anos: Hungria, Polônia, Turquia, Rússia, Geórgia, Ucrânia, Bielorússia, Filipinas, Venezuela, Nicarágua e El Salvador, entre outros. Em todos esses casos, a erosão da democracia não ocorreu por golpe de Estado, sob as armas de algum general e seus comandados. Nos exemplos acima, o processo de subversão democrática se deu pelas mãos de presidentes e primeiros-ministros devidamente eleitos pelo voto popular (Levitsky & Ziblatt 2018, 3).

Em seguida, paulatinamente, vêm as medidas que pavimentam o caminho para o autoritarismo: concentração de poderes no Executivo, perseguição a líderes de oposição, mudanças nas regras eleitorais, cerceamento da liberdade de expressão, enfraquecimento das cortes supremas com juízes submissos, novas constituições ou emendas constitucionais com abuso de poder pelas maiorias, inclusive para ampliação do período de permanência no poder, com reeleições sucessivas[3]. O grande problema com a construção dessas democracias iliberais[4] é que cada tijolo, individualmente, é colocado sem violação direta à ordem constitucional vigente. O conjunto final, porém, resulta em supressão de liberdades e de eleições verdadeiramente livres e competitivas. Esse processo tem sido caracterizado como legalismo autocrático (Scheppele 2018). 

Três fenômenos diversos: populismo, extremismo e autoritarismo

Há três fenômenos distintos em curso em diferentes partes do mundo que estão associados a esta erosão democrática: a) o populismo; b) o extremismo; e c) o autoritarismo. Eles não se confundem entre si, mas quando se manifestam simultaneamente – o que tem sido frequente – trazem graves problemas para a democracia. Populismo é um conceito que vem sendo intensamente revisitado nos últimos tempos, com a conotação frequentemente negativa de manipulação de medos, necessidades e anseios da população. Como regra, oferece soluções simplórias – e erradas – para problemas complexos, atendendo a demandas imediatas que cobram preço alto no futuro[5]. O extremismo, que pode ser de qualquer lado do espectro político, caracteriza-se pela intolerância, pela inaceitação do diferente e pela rejeição ao pluralismo político, valendo-se comumente de ameaças de violência. E o autoritarismo envolve a repressão truculenta aos opositores, a intimidação ou cooptação das instituições de controle e diferentes formas de censura, permitindo o mando autoritário e sem accountability. A seguir, uma breve nota sobre cada uma dessas disfunções.

O populismo tem um núcleo ideológico bastante tênue, que é a divisão artificial da sociedade em “nós, o povo” e “eles, a elite”. Na maioria dos casos, tem a marca de lideranças personalistas e carismáticas, que chegam ao poder com um discurso antiestablishment – mesmo quando claramente fazem parte dele – e se apresentando como “diferentes de tudo isso que está aí”. Em rigor, não se trata de uma ideologia verdadeiramente, porque é imperativo que venha acompanhado de alguma doutrina política que lhe é externa, seja conservadora, liberal ou socialista. De fato, populismos podem ser de esquerda (Perón, Evo Morales, Rafael Correa) ou de direita (Orbán, Erdogan, Duterte). Dentro dessa visão, o populismo é um arremedo de ideologia, que precisa ser combinada com outra, constituindo antes uma estratégia de discurso e de ação. Com frequência, vem associado a uma postura nacionalista e à exploração do sentimento religioso. Outra característica é a necessidade de eleição de um inimigo, para embasar o discurso antagônico e beligerante, seja contra o comunismo, a globalização, os judeus, a imigração, os muçulmanos ou qualquer outro que a ocasião ofereça[6].

O extremismo político se manifestou, ao longo da história, em diferentes domínios da vida, inclusive no plano religioso, como documentam inúmeros eventos históricos, da Inquisição ao Jihadismo; e de um lado e de outro do espectro ideológico (à esquerda, por exemplo, com Stalin e Pol Pot, e à direita, com Mussolini e Hitler).  Na quadra atual, o mundo assiste a uma onda radical de direita. Três dos países mais populosos do mundo – Índia, Estados Unidos e Brasil – estão ou estiveram, recentemente, sob lideranças com essa identidade ideológica. Não figura sob esse rótulo, naturalmente, o conservadorismo político, cuja filosofia não entra em tensão com as instituições democráticas tradicionais[7]. O extremismo ameaçador é o que prega medidas como, por exemplo, fechamento do Legislativo, substituição integral dos juízes das supremas cortes, demonização da imprensa “elitista”, das ONGs “esquerdistas” e que enxergam comunistas em toda parte. Intolerância, agressividade e violência frequentemente acompanham o ideário marcado por nativismo (nacionalismo mais xenofobia), machismo, misoginia, homofobia, racismo, negacionismo científico e ambiental, rejeição a organismos internacionais de direitos humanos, exploração abusiva da religião e discursos de ódio de naturezas diversas[8]. Com exceção de regimes ditatoriais, como o de Franco, na Espanha, e Pinochet, no Chile, a extrema direita, desde a 2ª Guerra Mundial, havia ficado confinada a minorias situadas na margem da história. Nos últimos anos, porém, ela vem ingressando no mainstream da política, chegando ao poder pelo voto popular e minando a democracia “por dentro” (ver Mudde 2019)[9].

O autoritarismo, por sua vez, é recorrente na vida dos povos, desde o início do processo civilizatório. Com exceção dos breves e limitados períodos da era de ouro de Atenas e da República, em Roma, o despotismo, o mando feudal e o absolutismo acompanharam toda a trajetória humana. Esse quadro só começa a se alterar com as revoluções liberais do final dos séculos XVII e XVIII, sendo que a democracia só veio a se estabelecer, verdadeiramente, ao longo do século XX, como já assinalado. Ainda assim, houve recaídas dramáticas. Após a 2ª Guerra Mundial, a democracia se generaliza pelo mundo ocidental, em processos históricos ocorridos em diferentes partes do planeta, sucessivamente, incluindo Europa Continental, América Latina, Europa Central e Oriental e também África, como já detalhado. Não obstante essas ondas de redemocratização na segunda metade do século passado, o autoritarismo subsiste como uma tentação permanente em todos os continentes. Regimes autoritários implicam concentração de poder, com baixo ou nenhum grau de controle, enfraquecimento do Estado de direito e da separação de Poderes, perseguição a adversários políticos, censura à imprensa e ausência de eleições livres e competitivas. Ditaduras podem se apoiar em um líder ou em partidos, mas invariavelmente dependem da adesão das Forças Armadas.

Como se procurou demonstrar acima, populismo, extremismo e autoritarismo são fenômenos distintos, apesar de eventuais superposições. Ultimamente, porém, têm andado juntos, ameaçando a subsistência de inúmeras democracias. Em casos mais agudos, podem degenerar em fascismo, que se caracteriza por líderes que dividem em vez de unir, pela supressão de direitos dos não alinhados, pela exaltação exacerbada da grandeza da nação e pela disposição de utilizar da violência e quaisquer outros meios para atingir seus objetivos (sobre o tema, ver Madeleine Albright 2018)[10]. Episódios como o Brexit, a eleição de Donald Trump e a reação à sua derrota mostram que nem mesmo democracias consolidadas escapam dos vendavais contemporâneos. Em países como Turquia, Hungria e Polônia, há mesmo dificuldade em se afirmar que a democracia tenha sobrevivido em todos os seus elementos essenciais. O populismo extremista e autoritário se utiliza de estratégias semelhantes nos diferentes países em que procura se instalar, e que incluem: a) comunicação direta com seus apoiadores, mais recentemente utilizando as mídias sociais; b) by-pass ou cooptação das instituições intermediárias, que fazem a interface do povo com o governo, como o Legislativo, a imprensa e organismos da sociedade civil; e c) ataques às supremas cortes e tribunais constitucionais, com a tentativa de capturá-los e ocupá-los com juízes submissos. Tais cortes têm, precisamente, o papel constitucional de limitar o poder. Na verdade, as constituições institucionalizam e limitam o poder político, atribuindo a tais tribunais o papel de fazê-las valer.

Impossível não registrar, nesse contexto, o impacto da revolução tecnológica ou digital sobre a vida contemporânea, com destaque para o papel desempenhado pelas mídias sociais. A internet revolucionou o mundo da comunicação interpessoal e social, ampliou exponencialmente o acesso à informação e ao conhecimento e, ademais, criou um espaço público em que qualquer pessoa pode manifestar suas ideias, opiniões e divulgar fatos. Nesse sentido, é impossível exagerar sua importância para a democratização da sociedade em escala global, universalizando bens e utilidades que anteriormente constituíam privilégios de alguns. No plano político, ela foi igualmente fundamental para processos históricos importantes – ainda que não inteiramente bem-sucedidos – como foi, por exemplo, a Primavera Árabe.

Anteriormente à internet, a difusão de notícias e de opiniões dependia, em grande medida, da imprensa profissional. Cabia a ela apurar fatos, divulgar notícias e filtrar opiniões pelos critérios da ética jornalista. Havia, assim, um controle editorial mínimo de qualidade e de veracidade do que se publicava. Não que não houvesse problemas: o número de veículos de comunicação é limitado e nem sempre plural, as empresas jornalísticas têm seus próprios interesses e, além disso, nem todos distinguiam, com o cuidado que se impõe, fato de opinião. Ainda assim, havia um grau mais apurado de controle sobre aquilo que se tornava público. A internet, com o surgimento de sites, blogs pessoais e, sobretudo, das mídias sociais, possibilitou a ampla divulgação e circulação de ideias, opiniões e informações sem qualquer filtro. A consequência negativa, porém, foi que também permitiu a difusão da ignorância, da mentira e de atentados à democracia.

Em todo o mundo, plataformas tecnológicas como Facebook, Instagram, YouTube, WhatsApp, Twitter e TikTok passaram a ter um peso importante no processo político-eleitoral[11]. Embora haja variação de país para país, as mídias sociais tiveram papel decisivo em eleições nos Estados Unidos, Índia, Hungria e Brasil, entre outros, bem como no processo de votação do Brexit. Um dos grandes problemas da atualidade tem sido o uso da internet e seus instrumentos para a disseminação de ódio, notícias falsas, desinformação e teorias conspiratórias por movimentos populistas, extremistas e autoritários, como estratégia para a chegada ao poder e sua manutenção. Por isso mesmo, em diversas partes do mundo, legisladores e reguladores discutem a melhor forma de exercer o controle da internet, sem comprometer a liberdade de expressão[12]. Os alvos são os comportamentos coordenados inautênticos – uso de robôs, perfis falsos e outros esquemas para forjar engajamento e afogar manifestações de terceiros – e as campanhas de desinformação, além da prática de crimes (terrorismo, pedofilia etc.). Cria-se um ambiente no qual as pessoas já não divergem apenas quanto às suas opiniões, mas também quanto aos próprios fatos. Pós-verdade e fatos alternativos são palavras que ingressaram no vocabulário contemporâneo. Uma das manifestações do autoritarismo é a tentativa de desacreditar o processo eleitoral para, em caso de derrota, poder alegar fraude e deslegitimar o vencedor. 

Algumas causas da erosão democrática

Há um conjunto de fatores que conduziram ao avanço do populismo conservador em países diversos, incluindo os Estados Unidos, a Grã-Bretanha e o Brasil. É possível sistematizar esses diferentes fatores em três categorias: políticas, econômico-sociais e cultural-identitárias (sobre o tema, ver Barroso 2019c). As causas políticas estão na crise de representatividade das democracias contemporâneas, em que o processo eleitoral não consegue dar voz e relevância à cidadania. “Não nos representam” é o bordão da hora (ver Castells 2018). Em parte, porque a classe política se tornou um mundo estanque, descolado da sociedade civil, e em parte pelo sentimento de que o poder econômico-financeiro globalizado é que verdadeiramente dá as cartas. Daí a ascensão dos que fazem o discurso antielite, antiglobalização e contra a “velha política”.

As causas econômico-sociais estão no grande contingente de trabalhadores e profissionais que perderam seus empregos (Oliveira 2019) ou viram reduzidas as suas perspectivas de ascensão social[13], tornando-se pouco relevantes (ver Harari 2018, 34) no mundo da globalização, da nova economia do conhecimento e da automação, que enfraquecem as indústrias e atividades mais tradicionais (Inglehart & Norris 2016, 2); sem mencionar as políticas de austeridade pregadas por organizações internacionais e países com liderança econômica mundial (Trotman 2017), que reduzem as redes de proteção social. Por fim, as causas culturais identitárias, que em alguma medida resultam também de um choque de gerações: há um contingente de pessoas de meia ou de mais idade que não professam o credo cosmopolita, igualitário e multicultural que impulsiona a agenda progressista de direitos humanos, igualdade racial, políticas feministas, união homoafetiva, defesa de populações nativas, proteção ambiental e descriminalização de drogas, entre outras modernidades. Essas pessoas, que se sentem desfavorecidas ou excluídas no mundo do “politicamente correto”, apegam-se a valores tradicionais que lhes dão segurança e o sonho da recuperação de uma hegemonia perdida[14]

Em interessante insight, Yascha Mounk (2018) observa que a democracia liberal padece de duas disfunções: (i) as democracias iliberais ou democracias sem direitos; e (ii) o liberalismo sem democracia ou direitos sem democracias. Ao analisar as democracias iliberais, em que líderes populistas eleitos vão paulatinamente suprimindo direitos, o autor identifica três fatores: o primeiro seria a estagnação social – ao contrário das décadas que se seguiram ao pós-guerra, em que pessoas dobraram sucessivamente sua renda, nas últimas décadas elas estão estacionadas; o segundo seria a perda da hegemonia racial – nos últimos tempos, as sociedades se tornaram mais diversas e multiculturais, com a ascensão de afrodescendentes e imigrantes em diferentes países, gerando ressentimento nas elites tradicionais; e o terceiro, a perda do filtro da mídia na comunicação social, pelo advento das redes sociais a internet deu voz a milhões de pessoas que antes não tinham acesso ao espaço público, abrindo caminho para a desinformação autoritária e teorias conspiratórias. Por outro lado, identifica ele, também, o que denominou de liberalismo sem democracia. Trata-se de fenômeno associado à maior complexidade da vida moderna, com perda do protagonismo do Legislativo como órgão de representação popular. De fato, nas últimas décadas, assistiu-se à ascensão de órgãos não eletivos na tomada de decisões que influenciam drasticamente a vida das pessoas, como, por exemplo, as agências reguladoras, o banco central, as cortes constitucionais e órgãos e agências internacionais, que concretizam tratados e convenções internacionais. 

A Democracia no Brasil: ameaças, resistência e superação

Assentadas algumas bases teóricas e descrito o cenário mundial, cumpre agora analisar como o processo histórico do populismo extremista autoritário impactou o Brasil. Em 1º de janeiro de 2019, Jair Bolsonaro assumiu a presidência da República, após derrotar Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores, obtendo quase 58 milhões de votos (55,13%). O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não pôde concorrer em razão da Lei da Ficha Limpa, por possuir, na ocasião, condenação criminal em 2º grau. Capitão reformado do Exército, o presidente eleito se apresentou como o candidato antiestablishment, apesar de ter sido deputado federal por sete mandatos, entre 1991 e 2018. Seus três filhos maiores também têm carreiras políticas. 

O cenário da ascensão de Jair Bolsonaro e as ameaças às instituições

A presidente Dilma Rousseff foi temporariamente afastada do cargo em 12 de maio de 2016, após autorizada a instauração do procedimento de impeachment, sendo definitivamente destituída pelo Senado Federal em 31 de agosto de 2016. A justificativa formal foram as denominadas “pedaladas fiscais” – violação de normas orçamentárias –, embora o motivo real tenha sido a perda de sustentação política. O vice-presidente Michel Temer assumiu o cargo até a conclusão do mandato, tendo procurado implementar uma agenda liberal, cujo êxito foi abalado por sucessivas acusações de corrupção. Em duas oportunidades, a Câmara dos Deputados impediu a instauração de ações penais contra o presidente.

Até a queda da presidente Dilma Rousseff, o Partido dos Trabalhadores havia permanecido 14 anos no governo. Não é o caso de se fazer aqui o balanço de realizações e desacertos do período. O fato inexorável é que, como não é incomum acontecer, após uma década e meia no poder o desgaste político se tornara inevitável. Havia na sociedade expressiva demanda por alternância no poder. Escândalos ao longo do período incluíram o Mensalão, o Petrolão, os Sanguessugas e outros episódios, relatados em diversas colaborações premiadas de agentes públicos e empresários.  A tudo se somou o descontrole fiscal revelado a partir do final de 2014, dando lugar a um quadro grave de recessão, desemprego e desinvestimento, com a perda pelo país do grau de investimento atribuído por agências internacionais. Na verdade, o país chegou a sonhar que o futuro havia chegado, com indicadores extremamente favoráveis, que levaram a revista The Economist a celebrar a decolagem e a perspectiva de o Brasil se tornar a quinta maior economia do mundo (2009). Não aconteceu. E, quatro anos depois, a mesma revista noticiou que o Brasil, ainda uma vez, desperdiçara uma chance (2013). A queda foi traumática.

Foi nesse contexto que surgiu e ganhou corpo a improvável candidatura de Jair Bolsonaro. Político que jamais estivera no mainstream ou no centro dos processos decisórios, era conhecido por manifestações retóricas radicais, como a defesa da ditadura, da tortura e a declaração de que se pudesse fuzilaria o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Ao votar a favor do impeachment da presidente Dilma, prestou homenagem a um militar acusado de ser notório torturador durante o período ditatorial. A ascensão de Bolsonaro coincidiu com o sucesso de movimentos da direita radical em diferentes partes do mundo, capturando o pensamento conservador, dos Estados Unidos à Hungria. Com utilização profissional e eficiente das mídias sociais, o candidato conseguiu catalisar o eleitorado que já não queria mais o PT no poder. Muitas das visões radicais acabaram encobertas por promessas que atendiam a demandas importantes da sociedade, como enfrentamento da corrupção, liberalismo econômico e supressão da velha política do “toma lá dá cá”.

Iniciado o governo, o combate à corrupção foi simbolizado pela indicação do ex-juiz Sergio Moro para o Ministério da Justiça. Não durou. Moro deixou o Ministério, pouco mais de um ano após o início do governo, acusando o presidente de interferir na Polícia Federal, inibindo o enfrentamento da corrupção. Para tocar a agenda liberal, foi indicado o economista Paulo Guedes, formado na Escola de Chicago, apelidado de “Posto Ipiranga”, pois resolveria todos os problemas. A agenda liberal tampouco durou. Passada a Reforma da Previdência, houve relaxamento da responsabilidade fiscal e paralisia das privatizações, gerando inúmeras baixas na equipe ministerial. Quanto à superação da velha política, o presidente aliou-se ao tradicional Centrão, estigmatizado pela imprensa pela voracidade por cargos e verbas públicas[15]

Ameaças às instituições

Bolsonaro se elegeu seguindo a cartilha populista tradicional: o povo simples, puro e conservador contra as elites sofisticadas, corrompidas e “esquerdistas”. Como inevitável, logo se colocou o conflito que marca as relações entre o populismo e a democracia: não há como cumprir as promessas de campanha sem se confrontar com as instituições supostamente ocupadas pelos representantes dessas elites. Na verdade, o populismo tem uma falha conceitual de origem: elites não são uma categoria homogênea, não correspondem a um bloco social único. Justamente ao contrário, existem diversas “elites”. Existem, é certo, elites extrativistas que precisam ser enfrentadas, porque colocam o Estado a serviço dos seus interesses. Elas são poderosas no Brasil. Mas existem elites qualificadas e indispensáveis no serviço público, do Itamaraty à Fundação Oswaldo Cruz; existem elites intelectuais que pensam e indicam rumos para o país, nas universidades e em diversos think tanks; existem elites empresariais verdadeiramente empreendedoras, decisivas para o emprego e para a geração de riquezas. Na prática, o discurso antielite acaba se transformando num discurso antidemocrático, anticientífico e antiempreendedorismo.

Os ataques às instituições vieram, articuladamente, de sites, blogs e canais de extrema direita, pregando invasão e fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal, com retirada à força de seus membros. Revelou-se a existência de esquemas profissionais de desestabilização democrática, com suspeita de financiamento público em alguns casos, potencializados pelo uso massivo das redes sociais, alimentadas por fanáticos, mercenários (que monetizam o ódio e a mentira), por trolls[16] e seguidores acríticos. A participação pessoal do presidente em manifestações antidemocráticas gerou preocupações até mesmo em setores que o apoiavam politicamente. Os exemplos foram se multiplicando: a) comparecimento a manifestação na porta da sede do comando do Exército, em que  se pedia a volta da ditadura militar; b) ataques diários à Justiça Eleitoral, ofensas pessoais aos seus integrantes e acusações falsas de fraude eleitoral em pleitos anteriores; c) desfile de tanques na Praça dos Três Poderes, com claros propósitos intimidatórios; d) pedido de impeachment de Ministro do Supremo Tribunal Federal, em razão de decisões judiciais que desagradavam o presidente; e) mudança de diretor-geral e de superintendentes da Polícia Federal por atuarem com independência; e f) ataques reiterados a jornalistas e órgãos de imprensa, assim como uso da verba publicitária oficial para cooptar apoios de conglomerados de comunicação social.

Curiosa e paradoxalmente, o momento que gerou maior temor para a estabilidade do regime democrático foi, também, o ponto de reversão do golpismo institucional. Tratou-se da grande manifestação convocada para o 7 de setembro, Dia da Independência. Com aluguel de centenas de ônibus vindos do interior e pagamento de refeições, os organizadores concentraram as manifestações em São Paulo e Brasília, com a expectativa de mais de um milhão de pessoas em cada uma delas. As bandeiras das manifestações eram heterogêneas e incluíam o fechamento do Supremo Tribunal Federal, o impeachment de ministros da Corte e o voto impresso com contagem pública manual. Alguns manifestantes defendiam a volta do regime militar, com a manutenção do presidente no poder. Outros exigiam o fechamento da representação diplomática da China, fora outras idiossincrasias. O presidente compareceu a ambas as manifestações, ofendeu diretamente um ministro do STF, acusou outro de pretender fraudar as eleições e afirmou que não mais cumpriria decisões judiciais com as quais não concordasse.

O comparecimento popular, todavia, foi menos de um décimo do esperado, demonstrando o tamanho diminuto da direita radical. Também causou frustração a muitos na militância a não adesão das polícias militares à manifestação, tendo as tropas estaduais permanecido disciplinadas. Nenhum oficial militar graduado fez qualquer sinal de apoio. Além disso, houve reação imediata das instituições e da imprensa. Em suma, não havia apoio popular nem de qualquer setor relevante à quebra da legalidade. A verdade surpreendente é que 48 horas após a manifestação, o presidente modificou inteiramente o discurso, justificando-se pelo “calor do momento” (UOL 2021) e procurando aqueles a quem havia ofendido para se explicar como podia. Dias depois, em entrevista à revista Veja, negou qualquer intenção de golpe e, subitamente, passou a afirmar ter confiança nas urnas eletrônicas e no processo eleitoral, que havia atacado por meses a fio (Lima & Junior 2021). 

A resistência democrática

As repetidas ameaças à legalidade constitucional e à estabilidade das instituições geraram firme reação de múltiplos setores. Em primeiro lugar, a imprensa, a despeito de boicotes publicitários e das próprias dificuldades contemporâneas do seu modelo de negócios, foi um bastião de resistência. Distinguindo com propriedade fato de opinião, manteve o tom crítico e desempenhou com desassombro o papel fiscalizador que lhe cabe. Apesar dos muitos temores de envolvimento das Forças Armadas, também as suas lideranças souberam resistir a seduções indevidas. O ministro da Defesa e os comandantes militares deixaram o cargo com altivez, por não concordarem, segundo divulgado, com o uso político e intimidatório da instituição[17]. O Supremo Tribunal Federal, que vinha dividido no tema do combate à corrupção, uniu-se na defesa da democracia. Nessa linha, reiterou compromissos com a liberdade de expressão, com a preservação de conselhos da sociedade civil, com o devido processo legal legislativo e, sobretudo, confrontando os ataques às instituições desferidos por grupos extremistas. Em diferentes investigações que vieram a ser reunidas em um único inquérito, que apura a atuação de organizações criminosas, o Tribunal coibiu, com oitivas, buscas e apreensões e mesmo prisões preventivas, as ameaças de violência contra seus ministros e suas instalações. Também o Tribunal Superior Eleitoral, integrado por três ministros do STF, enfrentou os comportamentos antidemocráticos instaurando procedimentos para apurar falsas alegações de fraude contra o sistema eletrônico de votação, bem como determinando a “desmonetização” de sites e canais que difundiam desinformação contra o processo eleitoral e contra a democracia.

Relativamente à pandemia, diante de posições de autoridades que negavam ou minimizavam sua importância e consequências, o Supremo Tribunal Federal produziu uma longa série de decisões que preservaram a saúde da população e salvaram milhares de vidas. De fato, o Tribunal (i) assegurou aos estados e municípios o poder de tomar medidas para proteger a população; (ii) impediu o lançamento da campanha convocando a população a voltar para as ruas e para o trabalho, quando todas as entidades médicas recomendavam recolhimento; (iii) afirmou constituir erro grosseiro,  para fins de responsabilização de agentes públicos, a não observância dos consensos médico-científicos; (iv) determinou a divulgação do plano de vacinação, (v) a vacinação compulsória e (v) a proteção das comunidades indígenas; entre outros julgados.

Finalmente, após as manifestações de 7 de setembro, com as graves ameaças do Presidente da República às instituições, houve duros pronunciamentos do presidente do Congresso Nacional, do presidente do Supremo Tribunal Federal e, igualmente, do presidente do Tribunal Superior Eleitoral, o qual fez severa crítica não apenas ao conteúdo, como também à forma imprópria como se expressa o chefe de Estado: 

Insulto não é argumento. Ofensa não é coragem. A incivilidade é uma derrota do espírito. A falta de compostura nos envergonha perante o mundo. A marca Brasil sofre, nesse momento, uma desvalorização global. Somos vítimas de chacota e de desprezo mundial.

Um desprestígio maior do que a inflação, do que o desemprego, do que a queda de renda, do que a alta do dólar, do que a queda da bolsa, do que o desmatamento da Amazônia, do que o número de mortos pela pandemia, do que a fuga de cérebros e de investimentos. Mas, pior que tudo, nos diminui perante nós mesmos. Não podemos permitir a destruição das instituições para encobrir o fracasso econômico, social e moral que estamos vivendo.

A democracia tem lugar para conservadores, liberais e progressistas. O que nos une na diferença é o respeito à Constituição, aos valores comuns que compartilhamos e que estão nela inscritos. A democracia só não tem lugar para quem pretenda destruí-la (Consultor Jurídico 2021).

Considerações Finais

Três inimigos da democracia em todo o mundo

Pesquisas em diferentes partes do mundo revelam a perda de prestígio dos governos fundados na soberania popular. A democracia já viveu momentos mais efusivos. Especialmente na nova geração, que não viveu as agruras das ditaduras, a tolerância com alternativas autoritárias é preocupante. O futuro da democracia exige o enfrentamento de alguns inimigos poderosos, que a minam por dentro; do contrário, continuará sob a ameaça permanente do populismo, do extremismo e do autoritarismo, bem como de lideranças demagógicas. Identifico a seguir três deles. 

A democracia já viveu momentos mais efusivos. Especialmente na nova geração, que não viveu as agruras das ditaduras, a tolerância com alternativas autoritárias é preocupante.

Apropriação do Estado por elites extrativistas

Uma das principais causas da queda do prestígio da democracia no mundo contemporâneo é a apropriação do Estado por elites econômicas, políticas e burocráticas extrativistas (sobre o tema, ver Acemoglu & Robinson 2013), que colocam o Estado a serviço dos seus interesses, num pacto oligárquico e plutocrático. No Brasil, essa apropriação privada do Estado se manifesta em loteamento de cargos públicos e do controle de empresas estatais, em desonerações inexplicáveis à luz do interesse público, em financiamentos públicos injustificáveis e em um sistema tributário que, proporcionalmente, cobra mais dos pobres do que dos ricos. Isso quando não degenera em coisas piores, como o recebimento de vantagens indevidas em contratos públicos, a cobrança de pedágios em empréstimos públicos, investimentos ruinosos feitos por fundos de pensão de empresas estatais em troca de propinas, superfaturamento de obras públicas em geral, com repasse para os agentes públicos que as viabilizaram e achaques a pessoas e empresas em comissões parlamentares de inquérito[18]

Pobreza extrema e desigualdades injustas

Apesar de melhoras relevantes, os números da pobreza extrema no mundo ainda são dramáticos. Cerca de 800 milhões de pessoas vivem com renda de menos de 2 dólares por dia, que é o critério adotado pelo Banco Mundial. No Brasil, de acordo com o IBGE, 6,5% da população vivem em pobreza extrema, somando cerca de 13,5 milhões de pessoas que vivem com renda mensal de 145 reais. É uma quantidade maior do que a população de países como Bolívia, Bélgica, Grécia e Portugal. Desde 2014, 4,5 milhões de pessoas caíram abaixo da linha da pobreza extrema. Desse total, 72,7% são pretos ou pardos. A miséria atinge, principalmente, os estados do Norte e do Nordeste. O Maranhão tem a maior proporção de pobres. Para aumentar a gravidade desses números, deve-se observar que eles foram obtidos antes da crise humanitária da pandemia da Covid-19 (Nery 2019, Jiménez 2019).

A desigualdade é uma categoria mais complexa. Trata-se de um conceito relacional, que identifica disparidade na distribuição de bem-estar, riqueza e poder em uma sociedade. Ela se manifesta em muitas dimensões, que incluem desigualdades de renda, de gênero, racial, regional e entre países. Fez-se referência a desigualdades injustas, porque há desigualdades inevitáveis, que fazem parte da vida. Se uma escritora vende milhões de livros ou um atleta extraordinário assina um contrato milionário, eles se tornam desiguais. Mas a desigualdade que se quer combater não é a que privilegia o talento e o esforço, mas sim a que nega iguais oportunidades às pessoas, gerando incluídos e excluídos. A desigualdade no mundo é espantosa: o 1% mais rico detém 44% da riqueza global. Os 10% mais ricos detêm 82% (Credit Suisse 2019). No Brasil, o 1% mais rico concentra 1/3 da renda (DW Brasil 2019). 

Sentimento de pertencimento

Como se disse ao início, a democracia envolve a ideia de pertencimento, de participação da cidadania em um projeto de autogoverno coletivo. O voto, o respeito aos direitos de todos e o debate público permanente são da sua essência. Todavia, tanto a apropriação privada do Estado quanto a pobreza extrema/desigualdade produzem exclusão social e desencontro entre os cidadãos e a política. Esse desamparo torna parte do eleitorado presa fácil dos discursos antiestablishment e do populismo autoritário. A tudo se soma uma certa percepção de que as grandes decisões que repercutem sobre todos terminam sendo tomadas, nesse mundo globalizado, nos grandes centros de poder econômico, político e militar. Países em desenvolvimento e não centrais antes dão suporte do que participam do processo decisório em geral.

Em diversos países, inclusive o Brasil, a esse conjunto de problemas soma-se, também, uma corrupção estrutural, sistêmica e institucionalizada. Não há como nos tornarmos verdadeiramente desenvolvidos com os padrões de ética pública e ética privada que se praticam aqui. Tivemos avanços e recuos nessa área, porque a história não é linear. Na verdade, a cultura de apropriação privada do Estado, que deságua na corrupção, é trabalho para mais de uma geração. A notícia boa é que já começou. 

O aprimoramento da democracia no Brasil: três pactos

No Brasil, tudo sugere que as ameaças de golpe, quebra da legalidade constitucional ou desrespeito aos resultados das eleições estejam superadas ou minimizadas. Mas será preciso reforçar as instituições e recuperar o país econômica e socialmente, após as vicissitudes da pandemia e dos desacertos sucessivos. Vivemos um momento difícil e complexo, com o país dividido, polarizado, com discursos agressivos de parte a parte. Devemos buscar consensos mínimos, capazes de aglutinar as pessoas em torno de alguns denominadores comuns patrióticos. Nessa linha, alinhavo a seguir a proposta de três pactos de caráter suprapartidário. 

Pacto de Integridade

Precisamos de um pacto de integridade que substitua o pacto oligárquico que tem vigorado até aqui. A integridade vem antes da ideologia. Uma democracia tem espaço para projetos conservadores, liberais e progressistas de sociedade. Mas não para projetos fundados na desonestidade, em que uma democracia desvirtuada é financiada com dinheiro desviado da sociedade. O Pacto de Integridade funda-se em duas regras elementares: a) na esfera pública, não desviar dinheiro; b) na esfera privada, não passar os outros para trás. Esta será a grande revolução brasileira.

O Pacto requer: (i) no Legislativo, uma reforma política capaz de atender a três objetivos: baratear o custo das eleições, aumentar a representatividade do Congresso e facilitar a governabilidade; (ii) no Executivo, livrar-se da mentalidade de que agentes públicos são sócios do país e que podem ter algum tipo de vantagem em todos os contratos públicos; e (iii) no Judiciário, derrotar a cultura de que a criminalidade do colarinho branco não tem maior gravidade, dando tratamento leniente aos crimes de rico em geral: corrupção ativa e passiva, peculato (desvio de dinheiro público), fraude em licitações, lavagem de dinheiro e sonegação de tributos. 

Pacto de Responsabilidade fiscal, econômica e social

Este é um pacto que tem três dimensões:

a) Responsabilidade fiscal: foi o descontrole nas contas públicas que produziu um quadro de recessão, desemprego e desinvestimento que comprometeu dramaticamente o desenvolvimento nacional. O gasto prolongado acima da arrecadação, com geração de déficits crônicos, traz desinvestimento, desemprego, juros altos e inflação, penalizando sobretudo os mais pobres. Não importa quão generosa seja a intenção, é uma questão aritmética: a conta um dia chega e é cara. A responsabilidade fiscal não tem ideologia, não é de esquerda ou de direita. Ela é uma premissa das economias saudáveis.

b) Responsabilidade econômica: precisamos de menos Estado econômico-administrativo, mais sociedade, mais livre iniciativa e mais movimento social. Isso significa menos cargos em comissão, menos financiamento público, menos desonerações, menos empresas estatais. Nós somos uma sociedade viciada em Estado. Capitalismo se faz com concorrência e risco. No Brasil, todo mundo quer financiamento público e reserva de mercado. Isso é socialismo às avessas. A responsabilidade econômica exige, além da reforma tributária referida a seguir, também uma reforma administrativa que diminua o peso do Estado. Não do Estado social, que fique bem claro.

c) Responsabilidade social: o país precisa voltar a crescer e gerar emprego para as pessoas e recursos para promover justiça social. Justiça social se faz com: (i) sistema tributário justo: o nosso, além de extremamente complexo, é regressivo, concentrador de renda, com ênfase nos impostos sobre consumo, em que o patrão e o empregado pagam o mesmo valor; (ii) políticas públicas que não sejam concentradoras de renda, como era, até pouco tempo, a Previdência Social; e (iii) serviços públicos de qualidade e programas sociais que funcionem como rede de proteção para os que verdadeiramente precisem. Os níveis de desigualdade no Brasil são insuportáveis. Os 5% mais ricos detêm 95% da renda nacional. Negros e mulheres são as principais vítimas da desigualdade.

Pacto pela Educação

Por fim, precisamos de um pacto pela Educação Básica, suprapartidário, de curto, médio e longo prazo. A educação tem que ser conduzida por nomes institucionais, conhecidos e respeitados. Ao contrário de outras áreas, em tema de educação já temos alguns diagnósticos precisos dos grandes problemas: (i) não alfabetização da criança na idade certa; (ii) evasão escolar no ensino médio; e (iii) déficit de aprendizado, isto é, os jovens terminam o ensino fundamental e o ensino médio sem terem aprendido o essencial. E há uma solução que tem sido chancelada por pesquisas recentes: a ênfase na educação infantil de zero a três anos, fase em que o cérebro da criança é uma esponja que absorve todas as informações que lhe são passadas. Essa é a hora de dar nutrição, afeto, respeito, valores e capacidades cognitivas. Mas para isso precisamos de creches públicas de qualidade, bem melhores das que existem atualmente, que por vezes até comprometem o desenvolvimento das crianças (Barroso 2021, 127). 

A eterna sombra da ditadura

No momento em que escrevo estas linhas – novembro de 2021 –, a América Latina vive processos históricos contraditórios. Dois deles merecem referência aqui. No Chile, ocorreu a eleição histórica de uma assembleia constituinte com paridade de gênero e presidida por uma acadêmica de origem indígena. A nova Constituição substituirá a que foi aprovada em plebiscito em 1980, ainda no regime de Pinochet, uma experiência que vem sendo observada com atenção no continente. Por outro lado, setores democráticos de todo o mundo condenam as eleições presidenciais fraudulentas na Nicarágua, na qual todos os sete candidatos de oposição a Daniel Ortega foram presos. Observadores e imprensa internacional não foram admitidos no país. A Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA) considerou que a reeleição de Daniel Ortega com 75% dos votos “não tem legitimidade democrática” (Maldonado 2021). Em retaliação, o governo da Nicarágua denunciou a Carta da OEA e retirou-se da organização.

Algum estranho fenômeno que assombra o mundo e o Brasil parece ter liberado demônios diversos, fazendo sair à luz do dia, sem cerimônia, misóginos, homofóbicos, racistas, fascistas, supremacistas, antiambientalistas, milicianos e corruptos, em meio a outras espécies primitivas.

No Brasil, ao longo de 2021, inúmeras manifestações pediram a volta do regime militar, “autorizando” o presidente da República a utilizar as Forças Armadas contra as instituições, notadamente o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (Castanho et al 2021). Algum estranho fenômeno que assombra o mundo e o Brasil parece ter liberado demônios diversos, fazendo sair à luz do dia, sem cerimônia, misóginos, homofóbicos, racistas, fascistas, supremacistas, antiambientalistas, milicianos e corruptos, em meio a outras espécies primitivas. Sem conceder ao pessimismo, impossível não lembrar da passagem ácida de Hannah Arendt: “Vivemos tempos obscuros, em que os piores perderam o medo e os melhores perderam a esperança”.

Nada obstante, como se procurou documentar neste texto, a mobilização antidemocrática arrefeceu. E o fato é que, a despeito de alguns sobressaltos, a democracia brasileira, sob a Constituição de 1988, já dura mais de três décadas. É o maior período de estabilidade institucional da nossa história. E não foram tempos banais. Convivemos, ao longo do período, com hiperinflação, planos econômicos fracassados, impeachment de dois presidentes da República, escândalos sucessivos de corrupção e, após 2014, uma prolongada recessão. E, nos últimos tempos, uma liderança política que louva os tempos ditatoriais e mais de uma vez ameaçou quebrar a legalidade constitucional. Ainda assim, temos tido eleições periódicas, alternância no poder, e todos os problemas têm sido resolvidos dentro do quadro da legalidade constitucional. Só quem não soube a sombra de viver sob uma ditadura não reconhece a luz de viver numa democracia.

A contenção do populismo extremista autoritário foi uma prova de vitalidade da democracia brasileira, espantando fantasmas que haviam voltado a assombrar as instituições. Mas feridas abertas e dívidas históricas ainda persistem, à espera de um país que consiga se tornar verdadeiramente desenvolvido e inclusivo. Que consiga chegar ao futuro sucessivamente adiado.

Notas 

[1] Huntington foi o primeiro a utilizar a ideia de “ondas de democratização”: a primeira onda teria ocorrido na primeira metade do século XIX, quando os países crescentemente foram adotando a ideia de sufrágio universal; a segunda se deu após o fim da Segunda Guerra Mundial; e a terceira a partir dos anos 1970. O texto é anterior ao florescimento de democracias após o fim do modelo comunista.

[2] Em 1900, nenhum país do mundo tinha seus governantes eleitos por sufrágio universal. Em dezembro de 1999, 119 países poderiam ser identificados como democráticos (Freedom House 1999). V. Barroso (2019b).

[3] Sobre o tema, v. o amplo levantamento feito por Mila Versteeg, em que registrou: “Globally, no fewer than one-third of the incumbents who reached the end of their prescribed term pursued some strategy to remain in office” (Versteeg et al. 2020).

[4] Aparentemente, o termo foi utilizado pela primeira vez por Fareed Zakaria (1997). Na prática política contemporânea, foi encampado pelo líder autoritário húngaro Viktor Orbán.

[5] A esse propósito, escreveu Samuel Issackaroff: “Populism tends to pitch itself to base impulses, to desires for immediate reward, to disregard for the future, whether it be the destruction of the rainforest, the prorogation of Parliament, or the momentary inflation of the currency” (2020, 1135).

[6] Sobre a definição e caracterização do populismo, v. Benjamin Moffitt (2020, 19) e Cas Mudde (2004, 543).

[7] Conservadorismo no sentido de preservação dos valores tradicionais, prudência nos processos de transformação social e ênfase no individual sobre o coletivo é uma das opções legítimas do mainstream político, estando ou tendo estado no poder em democracias consolidadas, como Alemanha, Reino Unido, França e Estados Unidos.

[8] Sobre o apelo emocional das teorias conspiratórias e sobre a degeneração do conservadorismo em extremismo, v. Anne Applebaum (2020, 45).

[9] Especialmente p. 2, 3, 18, 20, 168 e 172.

[10] Especialmente p. 11, 118 e 245.

[11] No Brasil, de acordo com pesquisa realizada pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal em 2019, 79% da população têm como principal fonte de informação o WhatsApp. Em segundo lugar vem a televisão (50%), seguida de YouTube (49%), Facebook (44%) e portais de notícias (38%). Jornais impressos, apenas 8% (Valente 2019).

[12] Sobre mídias sociais e seu impacto sobre a vida e as democracias contemporâneas, v. Luna van Brussel Barroso (2022 no prelo).

[13] “A combinação da desaceleração econômica depois de 2008 e o impacto do comércio globalizado nos salários nos países industrializados avançados manchou a legitimidade dos regimes democráticos como um jogo interno, um meio de institucionalizar as prerrogativas da elite” (Issacharoff 2018; e v. também Fernando Canzian 2019).

[14] “A essa crise da representação de interesses se une uma crise identitária como resultante da globalização. Quanto menos controle as pessoas têm sobre o mercado e o seu Estado, mais se recolhem numa identidade própria que não possa ser dissolvida pela vertigem dos fluxos globais. Refugiam-se em sua nação, em seu território, em seu deus” (Castells 2018).

[15] É célebre a frase de Stephen Holmes de que “a democracia é feita de promessas, decepções e da administração da decepção” (Holmes 2017).

[16] Troll, na linguagem da internet, identifica o usuário que veicula mensagens inflamatórias, agressivas e frequentemente falsas para produzir engajamento pela raiva, indignação, ódio e radicalismo.

[17] Segundo o ex-ministro da Defesa e da Segurança Pública, Raul Jungmann, o presidente da República teria determinado que jatos da Força Aérea Brasileira sobrevoassem o prédio do Supremo Tribunal Federal acima da velocidade do som para estourar os vidros do prédio, em ameaça aos juízes da Corte. A recusa teria motivado a demissão. Jungmann: “Bolsonaro determinou que jatos sobrevoassem STF para quebrar vidros” (Poder360 2021).

[18] Para uma descrição do cenário espantoso da corrupção no Brasil, v. Malu Gaspar, A organização (2020). 

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Recebido: 23 de novembro de 2021

Aceito para publicação: 11 de dezembro de 2021

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