O mundo vive um momento de reconfiguração acelerada da ordem internacional. A combinação de fragmentação geopolítica, desaceleração econômica em países desenvolvidos e o avanço de novas potências tem desafiado as instituições multilaterais e os padrões de governança global construídos no pós-Segunda Guerra. É nesse contexto que a presidência brasileira do BRICS em 2025 ganha relevância histórica.
O Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI) reconhece que o BRICS é uma das mais valiosas plataformas estratégicas à disposição do Brasil para projetar sua voz e reforçar sua autonomia internacional. O bloco, na visão brasileira, emergiu como uma necessidade cujo objetivo se fundamenta em gerar maior equilíbrio no sistema internacional e, atualmente, o BRICS tornou-se um espaço indispensável para a promoção de uma ordem multipolar, mais inclusiva e mais representativa.
Na visão do Estado brasileiro, o BRICS não é uma alternativa excludente na dimensão das relações estratégicas do país com o mundo Ocidental, tampouco uma aliança securitária ou de confronto geopolítico. Trata-se, antes, de uma plataforma de diálogo, construção de consensos e articulação pragmática em favor de reformas necessárias que o sistema internacional requer.
A visão institucional do CEBRI é clara: o Brasil deve utilizar o BRICS para ampliar sua margem de manobra estratégica, diversificar parceiros, reduzir vulnerabilidades externas e fortalecer sua capacidade de agir em diferentes tabuleiros internacionais. O BRICS é uma ponte para a Ásia, um espaço de aproximação com a África e um fórum que permite ao Brasil influenciar debates centrais sobre desenvolvimento sustentável, reforma de instituições multilaterais e financiamento internacional. Toda essa visão está amparada nos três fundamentos que orientam a doutrina da política externa brasileira: o pragmatismo, o realismo e o universalismo nas relações internacionais
A participação brasileira no BRICS se justifica, sobretudo, por razões econômicas objetivas. O bloco representa cerca de 45% da população mundial e uma parcela crescente do PIB global. A intensificação do comércio com China, Índia e outros membros do bloco já reposiciona o Brasil em importantes cadeias globais de valor, especialmente em setores como agronegócio, energia e minerais estratégicos. Além disso, os mecanismos financeiros do BRICS, como o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), oferecem alternativas concretas para o financiamento de infraestrutura, transição energética e inclusão digital – áreas centrais para o desenvolvimento brasileiro.
Do ponto de vista político-diplomático, o Brasil valoriza a construção de pontes entre diferentes polos de poder. O BRICS, na concepção brasileira, é um espaço em que, apesar de eventuais divergências pontuais, podem se discutir sem precondições ou amarras a solução pacífica de controvérsias e a democratização da governança global. Pois essa deveria ser a essência do multilateralismo: a aglutinação e o diálogo, e não a fragmentação e o imobilismo diplomático.
A ideia de que o BRICS representa um esforço antiocidental é incompatível com a leitura que o CEBRI faz da política externa brasileira. É incompatível com os interesses estratégicos do Brasil com a Europa e com os Estados Unidos. Com os países europeus, temos uma longa e produtiva relação de cooperação e convergências em múltiplos temas. Com os EUA, temos 200 anos de história, e o país é o nosso segundo maior parceiro comercial e primeiro maior investidor direto no Brasil. Tanto com a Europa quanto com os EUA, temos uma sólida e profunda cooperação no campo da defesa – em diversos programas militares do Exército, da Marinha e da Força Aérea. Isso sem contar a cooperação na área cultural e em outras áreas vitais para a humanidade como, por exemplo, o tema climático.
A ampliação recente do bloco, com a entrada de novos membros, impõe novos desafios e abre novas oportunidades. O aumento da heterogeneidade torna a construção de consensos mais complexa, mas, ao mesmo tempo, aumenta o peso político e econômico do BRICS. Para o Brasil, a diversidade do grupo deve ser vista como um ativo diplomático, não como um obstáculo. A capacidade brasileira de atuar como mediador, articulador de agendas comuns e promotor de soluções negociadas ganha ainda mais valor nesse novo contexto.
O CEBRI entende que o Brasil precisa olhar para o BRICS como uma plataforma de médio e longo prazo, em que os ganhos são tanto tangíveis (em comércio, investimento e acesso a financiamento) quanto intangíveis (na elevação do perfil internacional do país e na capacidade de influência normativa). Essa leitura está refletida também no conjunto de artigos desta edição da CEBRI-Revista, que aborda desde os desafios econômicos globais, passando pelas novas dinâmicas de financiamento internacional, até os dilemas geopolíticos associados à multipolaridade emergente.
A presidência brasileira em 2025 é mais que um evento diplomático ordinário, mas um marco estratégico para a reafirmação do papel do Brasil como um construtor de pontes e um defensor ativo de uma ordem internacional mais equilibrada, inclusiva e sustentável. Os desafios da Guerra da Ucrânia, da Guerra ao Irã, da Guerra à Gaza são reflexos do anacronismo que um sistema internacional desbalanceado representa. São reflexo do imobilismo e da falta de capacidade de endereçar questões relevantes para os problemas mais prementes do mundo.
O Brasil tem reiteradamente advogado para uma reforma ampla das Nações Unidas e de seu Conselho de Segurança. Não que isso irá resolver todas as mazelas da humanidade, porém, ao menos, essa reforma trará maior legitimidade e maior equilíbrio na solução dos problemas e onde o respeito ao direito internacional tende a ter um pouco mais de valor.
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